Stephen N. Zack

Em 30 de abril de 2008, o Brasil atingiu um marco importante, quando a agência de classificação de risco Standard & Poor’s elevou a dívida soberana brasileira para grau de investimento – decisão tomada também pela Fitch Ratings na semana passada. A mudança significou uma recompensa ao governo brasileiro por ter feito escolhas macroeconômicas e fiscais responsáveis para proteger a integridade da economia. Entretanto, o Brasil não pode se acomodar só porque recebeu o “investment grade”. Ele deve continuar a buscar uma política econômica sólida para proteger sua nova classificação e avançar. Para isto, o país deve continuar seus esforços para melhorar a qualidade do governo em todos os níveis e a observância do “rule of law” (estado de Direito), com foco permanente no fortalecimento da segurança jurídica.

O sistema jurídico independente do Brasil dá ao país uma vantagem sobre a Rússia, a China e até sobre a Índia no sentido de atrair investimentos estrangeiros. O sistema judicial nos outros países dos Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) é repleto de corrupção, interferência governamental, sigilo e/ou ineficiência.

Neste cenário, as contínuas melhorias no sistema jurídico fazem do Brasil um porto seguro para investidores em comparação com os seus companheiros Bric. Diferentemente da China e da Rússia, o Poder Judiciário brasileiro acabou de celebrar 200 anos de independência do governo. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) permanece como uma defensora vigorosa do Judiciário contra a ingerência governamental. Além disto, o Brasil possui uma jurisprudência rica e vibrante, com raízes profundas no direito romano.

Da mesma forma, os tribunais brasileiros estão cada vez mais receptivos ao conceito de que as decisões devem respeitar precedentes. De fato, a lei que regulamentou a súmula vinculante em 2006 vai ajudar a agilizar o processo judicial, reduzir a carga de trabalho no Poder Judiciário e garantir uniformidade nas decisões. Neste mesmo aspecto, a Lei nº 11.672, de 2008, recentemente sancionada, se consolida também como um passo gigantesco na redução de recursos redundantes às instâncias superiores.

As contínuas melhorias no sistema jurídico fazem do Brasil um porto seguro para investidores em relação aos Bric

Por outro lado, a lei brasileira de arbitragem e a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de reconhecer adjudicações de arbitragens estrangeiras é um incentivo a companhias estrangeiras a investirem no Brasil. Assim como a nova Lei de Falências, que permite que empresas com problemas se reorganizem oferecendo recursos significativos aos credores. A Standard & Poor’s analisou cuidadosamente a nova Lei de Falência quando esta foi aprovada e, sem dúvida, levou-a em consideração quando chegou à sua avaliação geral de risco do Brasil.

Infelizmente, o resto do mundo está atrasado com relação ao Brasil na observância dos princípios de segurança jurídica. A American Bar Association (ABA), uma organização de filiação voluntária de cerca de 400 mil advogados, luta por promover o estado de Direito nos Estados Unidos e no exterior. Em parceria com ordens de advogados e outras importantes organizações de todas as nacionalidades, a ABA lançou o “World Justice Project” (WJP), um ambicioso programa para promover a segurança jurídica em todo o mundo.

O World Justice Project propõe uma definição funcional da segurança jurídica que compreende quatro princípios universais: 1) O governo, os governantes e agentes são puníveis sob a lei. 2) As leis são claras, divulgadas, estáveis e justas, e protegem os direitos fundamentais, incluindo a segurança de pessoas e propriedade. 3) O processo pelo qual as leis são promulgadas, administradas e executadas é acessível, justo e eficiente. 4) As leis são mantidas e o acesso à Justiça é dado por autoridades de combate ao crime, advogados ou procuradores e juízes competentes, independentes e éticos, que devem ser em número suficiente, ter recursos adequados e refletir a formação das comunidades às quais eles servem.

A ausência da segurança jurídica condena bilhões a uma vida caracterizada pela violência, pobreza, corrupção, doenças e ignorância. Como um guia para a melhoria, o World Justice Project está elaborando um índice de segurança jurídica que avaliará a observância dos países aos quatro princípios acima mencionados. Sua metodologia está sendo refinada e testada na Nigéria, Índia e Chile e nos Estados Unidos, com o objetivo de ter o índice operacional em 100 países em dois anos. Convidamos profissionais brasileiros de todos os setores a assumir um papel de liderança no World Justice Project e trabalhar dentro da sua estrutura para promover a questão da segurança jurídica no Brasil e no exterior. O mundo será um lugar melhor e mais seguro se o sistema puder ser fortalecido globalmente.

O Brasil, por exemplo, poderá otimizar sua própria posição competitiva ao continuar a abraçar os princípios associados à segurança jurídica para otimizar a segurança pública, reduzir a pobreza, eliminar a corrupção, agilizar o processo judicial, melhorar a saúde pública e aumentar o acesso a uma educação de qualidade. Agências de classificação certamente reagirão de modo favorável se o Brasil tiver uma boa pontuação no índice de segurança jurídica e irão premiar o país, melhorando sua avaliação. Isto, por sua vez, estimulará investimentos estrangeiros, fortalecerá a economia brasileira e criará prosperidade para os brasileiros de todas as classes econômicas nos próximos anos.

Stephen N. Zack é advogado, sócio do escritório Boies, Schiller, & Flexner, LLP de Miami, comissário do World Justice Project e o próximo presidente da American Bar Association (ABA), cargo que assume em agosto de 2009

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

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