Liminar paralisa demissões até que empresa comprove, na próxima semana, o quanto foi afetada pela crise

Tribunal aponta falta de negociação com sindicatos e reflexos sociais dos cortes; especialistas discordam, e Embraer diz que recorrerá

O TRT (Tribunal Regional do Trabalho) da 15ª Região, em Campinas (SP), determinou ontem a suspensão das cerca de 4.200 demissões na Embraer ocorridas na semana passada e pediu que a empresa apresente, em audiência na próxima semana, os balanços patrimoniais e demonstrativos contábeis dos dois últimos anos.

No dia em que anunciou as demissões, a Embraer afirmou que os cortes são decorrência da “crise sem precedentes que afeta a economia global, em particular o transporte aéreo”.

Em decisão liminar, o TRT ordenou a suspensão das rescisões contratuais dos trabalhadores realizadas entre os dias 19 e a próxima quinta-feira, data em que foi marcada uma audiência no tribunal para tentativa de conciliação entre Embraer e sindicatos da categoria.

A Embraer informou ontem, por meio de nota, que vai recorrer da decisão, “uma vez que procedeu as referidas dispensas rigorosamente de acordo com todos os preceitos e normas legais existentes”.

Na decisão, o presidente do TRT, desembargador Luís Carlos Cândido Martins Sotero da Silva, justificou que a liminar teve como principal motivação a questão econômica gerada pelas demissões. “Eu não tenho ainda amplitude de conhecimento sobre isso [problemas econômicos da Embraer], tanto é que peço na liminar que eles tragam balancetes. Posso pedir também até a realização de perícia ou auditoria”, disse o desembargador à Folha.

O desembargador citou ainda na decisão os problemas sociais ocasionados pelas demissões: “Não se pode olvidar que as organizações empresariais possuem relevante papel no desenvolvimento social e econômico do país e, neste contexto, surge o conceito de responsabilidade social da empresa”.

A decisão trata ainda da “impossibilidade de se proceder as demissões em massa sem prévia negociação sindical”.

Segundo o TRT, a Embraer tem cinco dias para recorrer da decisão liminar. O recurso, chamado Agravo de Instrumento, deve ser dirigido ao colegiado do próprio TRT, composto por 12 desembargadores.

No entendimento do presidente do TRT, os trabalhadores devem receber pagamento normalmente, já que as rescisões estão suspensas até quinta-feira. “Até lá, a empresa é quem vai avaliar se colocará os funcionários na linha de trabalho ou se irá deixá-los em casa”, disse o desembargador.

Para basear juridicamente o ato, o desembargador usa, entre outros argumentos, o artigo 7º, inciso 1º, da Constituição Federal, que diz ser direito dos trabalhadores a “relação de emprego protegida contra despedida arbitrária”. A decisão atende à ação de entidades sindicais protocolada anteontem no TRT. Elas argumentam que a Embraer ignorou os sindicatos e não estabeleceu nenhum tipo de negociação.

Especialistas em direito do trabalho ouvidos pela Folha avaliam que a decisão do TRT não tem base legal.

“O Brasil não tem legislação sobre a dispensa coletiva. Não há lei que obrigue a empresa a negociar com sindicato antes de demitir. Além disso, a questão social alegada não é jurídica”, disse o professor titular e chefe do departamento de Direito do Trabalho da USP, Sérgio Pinto Martins.

Para a professora do curso de Processo do Trabalho da PUC-Campinas, Lúcia Avary de Campos, “o Estado não deve intervir em uma questão em que uma empresa privada não tem condições de suportar o vínculo com os empregados”.

Fonte: Jornal Folha de São Paulo, 1° de março de 2009.

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